"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Agustina Bessa-Luís - a casa em que nasceu


«Começo por visitar a casa onde Agustina nasceu. (...) 
Passamos pela antiga Câmara do concelho, pelo velho pelourinho, e descemos a rua até uma casa de pedra, de fachada ampla, erguida mesmo rente à estrada. Tem portas de armazém e um portão de ferro pintado de prata, que deita para um pequeno patamar lajeado, a partir do qual dois pequenos lanços de degraus de pedra dão acesso à casa.
Está quase em ruínas e prestes a ser vendida, anuncia o meu guia. (...) O dono cumprimenta-nos e abre-nos as portas. Acedemos ao pátio, subimos ao andar superior. Atravessamos um largo corredor envidraçado, onde a claridade levanta uma poalha luminosa. Ao fundo, transpondo uma porta pintada de amarelo ocre, há um quarto forrado de papel azul, com uma janela sobre o pátio, onde o sol se reflecte especialmente. Foi aqui, noutro Outubro, que Agustina nasceu. Sei que nessa tarde chovia torrencialmente, "aquela chuva do fim do Verão, ríspida e quase alegre". Virado a Sul, era o quarto mais iluminado e aquecido da casa, mas, nesse fim de tarde chuvosa, lá dentro já devia estar escuro. Suponho que os candeeiros de azeite iluminassem frouxamente o espaço. Que já tivessem caído as folhas das glicínias. E que a água formasse poças no estreito patamar lajeado. Pelas seis da tarde, estando o vento de feição, deviam ouvir-se os sinos do mosteiro de Travanca. Sem que se soubesse, aquela casa convertia-se num lugar.»
Isabel Rio Novo


Agustina Bessa-Luís nasceu a 15 de Outubro de 1922, em Vila Meã.


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