Fui e voltei.
Muita água passou por debaixo das pontes, muitas vacas sorriram...
Houve eleições legislativas, antecedidas pela respectiva campanha e seguidas de um processo ainda em aberto de formação do Governo,
Na campanha, todos os partidos ou coligações correram por si e contra os outros.
Os resultados trocaram-lhes as voltas e não há nenhum que não precise de outros.
Se, habitualmente, todos se dizem vencedores, nenhum se pode proclamar vencedor absoluto.
Penso que é uma óptima situação política - o diálogo é a essência da democracia. O problema é que não existe o hábito dessa prática.
E se houve quem, acicatado pela desilusão dos resultados, encontrou uma saída airosa com o seu poder de iniciativa (já lhe deram muitos nomes...), inaugurou diálogos e se vangloria de ser capaz de o fazer, também houve quem, desorientado, ficasse - aparentemente, pelo menos - inactivo e sem capacidade de reacção, quando seria dele que se esperava o encetar do diálogo, porque foi vencedor relativo.
A falta de uma maioria absoluta obriga o líder da coligação vencedora a sair da sua zona de conforto e a procurar consensos, o que não é, manifestamente, a sua especialidade.
"Para dançar o tango são precisos dois", dizia José Sócrates (outro político pouco talhado para o diálogo), quando elogiava o sentido de responsabilidade e o patriotismo de Passos Coelho, em 2010.
O não hábito do diálogo e as visões de facção extremaram opiniões e posições.
O Presidente ajudou à festa, sobretudo com o discurso em que comunicou a indigitação de Passos Coelho para formar governo.
Como disse Viriato Soromenho Marques, "este PR empurrou o país para uma crispação que nos enfraquece as muralhas da inteligência, na altura em que mais precisaríamos delas".
Ajudou mais ao diálogo das esquerdas do que ao diálogo dos centros. Aumentou mais a divisão daquilo que pretendia aproximar. Quereria? Tanta falta de jeito em quem tem tantos anos de vida política!?
E usou argumentos que não têm cabimento nas razões políticas.
«(...) é meu dever, no âmbito das minhas competências constitucionais, tudo fazer para impedir que sejam transmitidos sinais errados às instituições financeiras, aos investidores e aos mercados, pondo em causa a confiança e a credibilidade externa do país (...)»
«(...) receio muito uma quebra de confiança das instituições internacionais nossas credoras, dos investidores e dos mercados financeiros externos.»
Voltamos à questão do último post, antes de eu "ir e voltar".
Não podemos aceitar viver debaixo de uma ditadura financeira, ainda por cima, imposta pelo exterior.
O poder político tem de prevalecer, sob pena de alienarmos o quadro democrático em que vivemos.
Se assim não fosse, nem se justificaria a existência de eleições para a Assembleia da República.
Se alguém afirma que não há alternativa é porque não acredita na democracia.
O poder político não pode ignorar a realidade económica e financeira, mas não pode ser subjugado (nem pôr-se a jeito de o ser) pelas instituições financeiras, pelos investidores e pelos mercados.
Votamos em agentes políticos e devem ser eles a construir alternativas.
E devem ser pessoas credíveis para que confiemos neles.
Não posso confiar em quem nos conduz à submissão face aos interesses financeiros.
Valores mais altos se levantam... ou se deviam levantar.
"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)
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