"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Júlio Dinis e a Morgadinha

Reler alguns livros muitos anos depois da primeira leitura traz as suas surpresas.
À procura da cena da consoada no Mosteiro, repeguei n’A Morgadinha dos Canaviais.

Surpreendi-me com Júlio Dinis, geralmente considerado o elo mais fraco quando comparado com outros nomes do século XIX, como Garrett e Herculano, primeiro, Camilo e Eça, depois. A “concorrência” é de peso! (JD nem sequer figura entre as biografias dos escritores portugueses do Instituto Camões. Os outros 4 acima mencionados lá estão.)
Já o professor José M. Sobral, na Faculdade, nos chamara a atenção da importância de JD para a compreensão de uma certa sociedade rural do país, na 3.º quartel do século XIX.

Na Morgadinha, o desenrolar dos conflitos sentimentais, vai a par com um diálogo informal com o leitor, como Garrett nas Viagens. Quem fez a sua biografia na Wikipédia diz tratar-se do “mais suave e terno romancista português, cronista de afectos puros, paixões simples, prosa limpa.” Oh, quanto romantismo! Verdade, mas a realidade social, com os seus conflitos, não deixa de estar presente e é o fundo do romance.
Há passagens plenas de ironia, mas em que o tom é mais suave ou mais condescendente que o de Eça, menos mordaz, talvez porque lhe esteja subjacente um maior optimismo, a esperança da modernização do país, porque o seu cenário – o mundo circundante que representa – é o do meio rural, numa época de prometedor progresso.

Júlio Dinis morreu muito novo, com apenas 31 anos.
Todos os outros escritores referidos viveram mais anos. Dele, ficou-nos a faltar muito do que poderia ter escrito.

Por ocasião da sua morte, em Setembro de 1871, escreveu Eça de Queirós em As Farpas:
«Tréguas por um instante nesta áspera fuzilaria irónica! Esta página é um parêntese tranquilo e meigo, onde pomos a lembrança de Júlio Dinis. Que as pessoas delicadas se lembrem dele, e se recolham um momento: recordá-lo é aprender a amá-lo; e nós, ainda não sabemos recordá-lo bastante. Tanto é o nosso mal, que este espírito excelente não ficou popular: a nossa memória, fugitiva como a água, só retém aqueles que vivem ruidosamente, com um relevo forte; Júlio Dinis viveu de leve, escreveu de leve, morreu de leve!»

É interessante o texto (ainda extenso) de Eça sobre Júlio Dinis.
Também me surpreendi com ele.

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