"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

sábado, 27 de abril de 2019

As casas de Almeida Garrett

Ardeu o interior do prédio onde nasceu Almeida Garrett (1799).
Ficaram as fachadas onde se pode ainda ver o medalhão que assinala esse facto.



O medalhão no prédio (foto de 2017? Vou procurar no "arquivo")

Ardeu agora a casa onde nasceu.
Foi demolida, em Campo de Ourique, no ano de 2006, a casa onde viveu os últimos anos da sua vida e onde faleceu.

Do fogo não sabemos as causas.
Da demolição, sabemos que foi ordenada por Manuel Pinho, ex-membro do Conselho de Administração do Grupo Banco Espírito Santo e Ministro da Economia e Inovação de um dos governos de Sócrates, que tinha adquirido a casa.
Manuel Pinho tem mais sensibilidade para as finanças do que para a cultura.
Depois de comprar a casa, terá exigido contrapartidas financeiras para a vender à Câmara (é o que se depreende do texto do jornal Público de 6 de Janeiro de 2006) ou, com toda a legitimidade, apenas a pretendia vender?

Porta da casa de Almeida Garrett em Campo de Ourique, Lisboa
A vida profissional de Manuel Pinho parece ter continuado com sucesso, apesar das polémicas associadas ao BES e à EDP.
As casas que foram de Garrett parecem estar com menos sorte.

Excerto da notícia de 6 de Janeiro:
«Como actual presidente do executivo camarário, Carmona Rodrigues justificou a decisão de autorizar o proprietário a demolir o imóvel com a inexistência de interesse da autarquia na preservação do edifício, além da falta de dinheiro para a sua transformação numa casa-museu, a aquisição de um espólio e o pagamento de contrapartidas a Manuel Pinho.

A autarquia recorda também que o Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) não classificou o edifício, tendo apenas recomendado a sua classificação como edifício de interesse municipal, mas já depois de emitida a autorização da demolição.»

Público, 6 de Janeiro de 2006

Este excerto também é elucidativo da forma de funcionamento de algumas instituições públicas.

A casa desenhada na capa do livro de José-Augusto França

Em 2007, José-Augusto França editou Garrett e outros contos, obra assim intitulada por incluir textos provocados pela demolição danosa, em 2006, da casa em que Almeida Garrett viveu os últimos anos da sua vida.


2 comentários:

  1. No caso do incêndio do Porto, as notícias têm feito eco das negociações que já existiam sobre o edifício, porque a Câmara o queria adquirir para Museu do Liberalismo. Parece-me uma óptima ideia, pela forte ligação da cidade ao liberalismo histórico, pelo papel de Garrett… Tudo!
    Mas estas situações do património fazem-nos sentir que somos do escalão dos pobrezinhos.
    Umas vezes, pobrezinhos de dinheiro, outras vezes, pobrezinhos de espírito, e ainda outras, pobrezinhos das duas coisas!
    Há pessoas de quem esperamos atitudes mais... elevadas.
    Acho que o caso que envolveu o ex-Ministro é mesmo triste, sob várias perspectivas.
    Não é possível preservar tudo (nem saudável, ou continuaremos no passado), mas…
    Um bom dia

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