"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

quinta-feira, 25 de abril de 2019

Janela (agora) com cravos

Janela da cadeia do Aljube, Abril de 2019.


Ariane é um navio. 
Tem mastros, velas e bandeira à proa, 
E chegou num dia branco, frio, 
A este rio Tejo de Lisboa. 

Carregado de Sonho, fundeou 
Dentro da claridade destas grades... 
Cisne de todos, que se foi, voltou 
Só para os olhos de quem tem saudades... 

Foram duas fragatas ver quem era 
Um tal milagre assim: era um navio 
Que se balança ali à minha espera 
Entre as gaivotas que se dão no rio. 

Mas eu é que não pude ainda por meus passos 
Sair desta prisão em corpo inteiro, 
E levantar a âncora, e cair nos braços 
De Ariane, o veleiro.
Miguel Torga

Poema escrito na cadeia do Aljube, no primeiro dia do ano de 1940.




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