Querido Urbano,
Nos ritmos desencontrados do tempo é difícil encontrar as palavras próprias no momento certo.
Escolho este 25 de Abril para te dizer aquilo que por timidez ou contenção emocional foi recalcado noutras ocasiões.
Lembro-me de ti (e do Manuel da Fonseca) na antecâmara do Tribunal fascista, aonde ias, sempre solidário, abonar o carácter do meu pai. Vi-te em múltiplas - e jamais recusadas - intervenções nos cineclubes, colectividades e associações de estudantes, numa altura em que a exposição pública só te poderia trazer (e trouxe) dissabores. Encontrei-te no processo revolucionário que se seguiu ao 25 de Abril, como paradigma de humildade, lucidez e extrema coragem, sem concessões à fadiga e às sobrecargas tarefeiras.
A tua invejável aura, Urbano. O respeito, o afecto, a amizade que todos temos por ti…
Sempre me senti tocado por essa gentileza de maneiras, pelo alcance da curiosidade, a clareza e articulação da exposição, a largueza e arrumação dos conhecimentos, a viva atenção a cada dobrar de página na cadência dos dias. Em múltiplos géneros avivam-se as personagens, os dilemas, as encruzilhadas destes tempos de que fazes a crónica aturada, talentosa e esclarecida.
Posso testemunhar a generosidade com que acolhias e encorajavas os autores mais jovens, os aconselhavas com desafectação, lhes emprestavas livros e davas as indicações que a vastidão dos teus conhecimentos sugeria. E nesta incessante procura do que de melhor havia nos outros, o teu sentido de justiça, de homem isento e indómito, levava-te a deixar de lado ideologias, opções de grupo, escolhas políticas ou famílias literárias.
São estas fugazes palavras uma nota modesta, que está muito longe dos teus méritos e pretende apenas assinalar a data de 25 de Abril de 2013, saudando em ti todos aqueles a quem, pela abnegação, desassombro, coragem e superioridade intelectual, ficámos a dever uma alegria rubra de esperança.
Mário de Carvalho
Urbano Tavares Rodrigues isboa, 6 de Dezembro de 1923 - 9 de Agosto de 2013 |
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