"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Manifesto pela Escola Pública

Manifesto pela Escola Pública
(assinado pelos autores de conhecidos blogues sobre educação)

Pela Escola Pública

Enquanto membros da comunidade educativa e autores de diversos blogues de educação temos opiniões livres e diversificadas. Porém, a Escola Pública, sendo um pilar social fundamental para a coesão nacional, merece o nosso esforço para nos unirmos no essencial. Este manifesto é uma tomada de posição pela valorização e defesa da Escola Pública.

A Constituição da República Portuguesa explicita o quadro de princípios em que o Estado, como detentor do poder que advém dos cidadãos, tem de actuar em matéria educativa. O desinvestimento verificado nos últimos anos, bem como a deriva das políticas educativas em matérias como a gestão de recursos humanos ou a organização e funcionamento das escolas e agrupamentos, tem ameaçado seriamente a qualidade da resposta da Escola Pública.

Importa por isso centrar o debate público nos seus fundamentos:

Assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito e estabelecer progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino – considerando o nível de desigualdade social instalado, importa aprofundar um trajecto de gratuitidade dos manuais escolares e um reforço da acção social escolar.

Criar um sistema público e desenvolver o sistema geral de educação pré-escolar – dada a importância confirmada do acesso e frequência de educação pré-escolar é fundamental garantir a sua universalização geográfica e economicamente acessível a todas as crianças.

Garantir a educação permanente e eliminar o analfabetismo – o ainda baixo nível de qualificação da população activa em Portugal exige uma opção política séria e competente em matéria de educação permanente e de qualificação.

Garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística – para que Portugal possa atingir os níveis de qualificação de nível superior definidos no quadro da União Europeia, é fundamental que se assegure uma política em matéria de bolsas de estudo. Portugal é um dos países da União Europeia em que a parte assumida pelas famílias nos custos de frequência de ensino superior é mais elevada.

Inserir as escolas nas comunidades que servem e estabelecer a interligação do ensino e das actividades económicas, sociais e culturais – a resposta de escolas e agrupamentos às especificidades das comunidades educativas que servem exige um reforço sério da sua autonomia. A centralização burocratizada e um caminho de municipalização que mantenha a falta de autonomia das escolas irá comprometer esse propósito. A autonomia das escolas deve contemplar matéria de natureza curricular, organizacional e de funcionamento escolar, bem como recuperar e reforçar a sua gestão participada e democrática.

Promover e apoiar o acesso dos cidadãos portadores de deficiência ao ensino e apoiar o ensino especial, sempre que necessário.

Proteger e valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades.

A promoção de uma Educação verdadeiramente assente em princípios de inclusão exige meios humanos, docentes e técnicos, apoio às famílias, a revisão do quadro legislativo que suporta a presença de alunos com Necessidades Educativas Especiais nas escolas e uma verdadeira autonomia das escolas e agrupamentos.

Nos últimos anos a Escola Pública, instrumento para que os deveres constitucionais do Estado sejam cumpridos no domínio da Educação, tem sido sujeita a múltiplas dificuldades, com cortes, com lançamento em cascata de medidas que a burocratizam de forma doentia e tentam degradar ou desvalorizar com base em rankings, diversos e dispersos, onde se compara o incomparável, muitas vezes baseados em frágeis indicadores administrativos e funcionais e não pedagógicos ou educacionais.

A valorização social e profissional do corpo docente e não docente, em diferentes dimensões, é uma ferramenta imprescindível e a base para um sistema educativo com mais qualidade.

A Escola Pública precisa de mais respeito, mais atenção, mais investimento e mais capacidade para, sendo pública, de todos e a todos acessível, sem outro dono que não o povo português, ter margem para se auto-governar e se adaptar a cada comunidade local, sem se esquecer que existe para cumprir objetivos nacionais fundamentais.

Portugal, 21 de Junho de 2016

Subscrevem (por ordem alfabética):

Alexandre Henriques – ComRegras
Anabela Magalhães – Anabela Magalhães
António Duarte – Escola Portuguesa
Assistente Técnico
Aventar
Blog DeAr Lindo
Duilio Coelho – Primeiro Ciclo
José Morgado – Atenta Inquietude
Luís Braga – Visto da Província
Luís Costa – Bravio
Manuel Cabeça – Coisas das Aulas
Nuno Domingues – Educar a Educação
Paulo Guinote – O Meu Quintal
Paulo Prudêncio – Correntes
Ricardo Montes – Professores Lusos


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