«Chamem-me Ismael. Há alguns anos, quantos ao certo não importa, com pouco ou nenhum dinheiro na bolsa, e sem nada de especial que me interessasse em terra, veio-me à ideia meter-me num navio e ver a parte aquática do mundo. É uma maneira que eu tenho de afugentar a melancolia e regularizar a circulação. Sempre que na minha boca se desenha um esgar carrancudo; sempre que me vai na alma um Novembro húmido e cinzento, sempre que dou comigo a deter-me involuntariamente em frente das agências funerárias ou a engrossar o séquito de todos os funerais com que me deparo; e, especialmente, sempre que me sinto invadido por um estado de espírito de tal maneira mórbido, que só os sólidos princípios morais me impedem de descer à rua com a ideia deliberada de arrancar metodicamente os chapéus a todos os transeuntes, nessa altura, dou-me conta que está na hora de me fazer ao mar, quanto antes. É o meu estratagema para evitar o suicídio. catão lança-se sobre a espada com um floreado filosófico; eu, calmamente, embarco. Nada há de surpreendente nisto. Embora não se dêem conta, tal como eu, quase todos os homens acalentam, mais tarde ou mais cedo, este desejo do mar.»
Este é o primeiro (e longo) parágrafo de
Moby Dick, cujo aniversário da edição (161.º) é lembrado hoje.
Neste dia cinzento de Outubro, também me meti num navio e embarquei. Fiz-me ao rio. Não por homenagem a Melville, mas por obrigação. Teve de ser, num modesto cacilheiro.
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