Marc Chagall, Os Amantes |
Entregue a ti, a tudo me abandono,
seguro e certo, num terror tranquilo.
A tudo quanto espero e quanto temo,
entregue a ti, Amor, eu me dedico.
Nada há que eu não conheça, que eu não saiba,
e nada, não, ainda há por que eu não espere
como de quem ser vida é ter destino.
As pequeninas coisas da maldade, a fria
tão tenebrosa divisão do medo
em que os homens se mordem com rosnidos
de malcontente crueldade imunda,
eu sei quanto me aguarda, me deseja,
e sei até quanto ela a mim me atrai.
Como queiras, Amor, como tu queiras.
De frágil que és, não poderás salvar-me.
Tua nobreza, essa ternura tépida
quais olhos marejados, carne entreaberta,
será só escárnio, ou, pior, um vão sorriso
em lábios que se fecham como olhares de raiva.
Não poderás salvar-me, nem salvar-te.
Apenas como queiras ficaremos vivos.
Será mais duro que morrer, talvez.
Entregue a ti, porém, eu me dedico
àquele amor por qual fui homem, posse
e uma tão extrema sujeição de tudo.
Como tu queiras, meu Amor, como tu queiras.
Jorge de Sena, in Post-scriptum
Poderia ter sido dedicado a Mécia de Sena.
Uma boa noite
Não é apenas uma poema sobre o amor, amar a quem se ama, mas um hino à vida.
ResponderEliminarPor alguma razão inexplicável, esse poema remeteu-me ao texto "Um bater-nos o Coração do Mundo no Coração: Carta-ensaio de Amor, do Oscar Lopes.
Perdoe-me eu tenho esse defeito de encadear textos.
Obrigada, pela postagem.
Cumprimentos.
:)
Encadear textos, ideias (até personalidades...) é tarefa interessante, sobretudo nestes tempos de isolamento (mais físico do que outro...).
EliminarNão conheço o texto de Óscar Lopes. Julgo ter sido editado há poucos anos, pelo centenário do seu nascimento.
Não deixa de ser curioso dois textos sobre o amor da autoria de dois homens "racionais", de elevada craveira intelectual, familiares por afinidade - Óscar Lopes era irmão de Mécia de Sena.
Obrigado pelo comentário.
Cumprimentos