«Ninguém como Camões nos representa a todos, repito, e em particular os emigrantes, um dos quais ele foi por muitos anos, ou os exilados, outro dos quais ele foi a vida inteira, mesmo na própria pátria, sonhando sempre com um mundo melhor, menos para si mesmo que para todos os outros. Ele, o homem universal por excelência, o português estrangeirado e esquecido na distância, o emigrante e o exilado, é em Os Lusíadas e na sua obra inteira, tão imensa e tão grande, a medida do mais universal dos portugueses e do mais português dos homens do universo. Ninguém, como ele desejou representar em si mesmo a humanidade, representar tão exactamente o próprio Portugal, no que Portugal possui de mais fulgurante, de mais nobre, de mais humano, de mais de tudo e todos, em todos os tempos e lugares. Ele é, como ninguém, o homem que viajou, viu e aprendeu. O homem que se sente moralmente no direito de verberar com tremenda intensidade, as desgraças de viver-se e os erros ou vícios da sociedade portuguesa. É o exilado físico de muitos anos mas é, como todos nós, e nisso tanto ou mais o somos que outros povos, o exilado moral, clamando por justiça, por tolerância, por dedicação à pátria, por espírito de sacrifício, por unidade nacional e universal, lá onde via que o homem é, como ele disse mais que uma vez, o "bicho da terra tão pequeno" contra o qual se encarniçam os poderes do mal.»
Jorge de Sena,
discurso como Presidente das Comemorações do 10 de Junho de 1977,
"Dia de Camões e das Comunidades Portuguesas",
proferido na cidade da Guarda.
Jorge de Sena era um notável especialista em Camões.
Comemora-se este ano o centenário do nascimento de Jorge de Sena, a 2 de Novembro, o mesmo mês em que a sua muito amiga Sophia de Mello Breyner Andresen também comemora o seu (6 de Novembro).
De Sophia muito se tem falado, de Jorge de Sena nem tanto. A dar-lhe razão de não ser um intelectual bem
quisto em Portugal.
Exilado no Brasil e nos Estados Unidos nos tempos da ditadura do Estado Novo, Jorge de Sena nunca se fixaria em Portugal, mesmo depois de 25 de Abril de 1974, falecendo em Santa Bárbara (EUA), a 4 de Junho de 1978.
«Sim, Jorge de Sena não era uma presença confortável para o Portugal de então. O que só lhe fica bem. Mas continuou a não ser uma presença confortável depois do 25 de Abril. O que só nos fica mal.. Na verdade, é uma vergonha nacional que não tenham sido dadas a este homem condições necessárias para regressar ao seu país quando, quero crer, o teria desejado se as necessárias condições lhe tivessem sido dadas.»
Hélder Macedo, De amor e de poesia e de ter pátria
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