"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Moedas e a Inovação (texto de Antunes Ferreira)


CADA VEZ estou convencido que a vergonha é coisa que caiu em desuso pelos ditos políticos portugueses. Dia após dia os exemplos vão avolumando-se e o povo ignaro assista a este festival de mentiras e despudor que é apresentado em todos locais, nomeadamente em feiras, circos e fantoches de rua, com o que antes era a ganapada que os aplaudia e hoje somos nós, os Portugueses, que os aturamos e, por vezes, até os aplaudimos. Já ninguém, ou quase, que encolhe os ombros e amocha quotidianamente.
(…) É fartar, vilanagem!
Carlos Moedas, ex-secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro (?) Passos Coelho, assumiu na terça-feira de manhã na sua audição no Parlamento Europeu, em Bruxelas, que discordou “muitas vezes” com a política da troika, mas mostrou capacidade de resposta, uma característica que considera importante como futuro comissário de Investigação, Ciência e Inovação. Isto porque, no seu entender o pais “precisava de mostrar credibilidade na Europa”.
E disse mais: “Estive durante três anos a ajudar no programa de ajustamento que foi muito difícil, foram sacrifícios enormes, sempre reconheci a dureza e o sacrifício do programa. Portugal estava num momento em que precisava de mostrar a sua credibilidade àqueles que deram dinheiro”, defendeu, na resposta à eurodeputada do Bloco de Esquerda Marisa Matias.
E se por acaso, longe vá o agouro, uma nova crise se apresentar, espera que a resposta política consista antes no investimento na ciência e inovação. No entanto, Carlos Moedas defende que o seu trabalho passado demonstrou a capacidade de resposta. “Sou uma pessoa que apresenta resultados e no Horizonte 2020 [o próximo programa europeu de financiamento da ciência] é importante ter uma pessoa que apresenta resultados.”
Tem o seu interesse verificar que um dos executantes mais empenhados na aplicação aos Portugueses do diktat da troika, com a enorme violência que é conhecida venha agora que até discordou dessa receita malfadada. É bem o exemplo de não ter vergonha na cara. Quando a dupla Passos e Gaspar se travestiu em Passos e Maria Luís aplicou a nós, os Portugueses, a subida dos impostos, os cortes nas pensões, até aos mais desprotegidos, renegando o contrato com elas assinado e deitando às urtigas a afirmação de que o Estado é pessoa de bem (era), Moedas lá estava acirradamente a implementar o desvario.
Agora, no Parlamento Europeu que o examinou saiu-se com esta mentira, o desavergonhado. Após três horas de questões ao futuro comissário que deverá ficar responsável pela pasta da Investigação, Ciência e Inovação, Carlos Zorrinho, do PS, que é membro efectivo da comissão de Indústria, Investigação e Energia, comentou que Moedas "estava bastante preparado e teve uma prestação claramente positiva". Mas, também disse que a grande questão é saber se Moedas será mais leal às ideais do presidente eleito da CE, Juncker, que fez do investimento uma das suas grandes "bandeiras", ou à linha do Governo português de Passos Coelho.
"Quase imagino o que vai ser o dia-a-dia de Carlos Moedas nos próximos tempos: de manhã receberá um telefonema de Jean-Claude Juncker a dizer «investe, investe, investe»; ao fim da tarde, Passos Coelho, que tem assento no Conselho e não tem feito nada para aumentar o investimento nesta área, vai telefonar a dizer «corta, corta, corta»", zombou Zorrinho, que ainda acrescentou que fica à espera de saber "de que lado estará" o antigo secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro nas suas funções como comissário.

Marisa Matias, do BE e João Ferreira afinaram pelo mesmo diapasão, naturalmente com algumas diferenças não substantivas. Ou seja Moedas está bem preparado para quê? Dispõe de 80 mil milhões até 2020 para apoiar, implementar e desenvolver as políticas de inovação, ciência e Inovação. Ao contrário do que fez enquanto membro do (des)Governo de Passos & Portas, agora na Europa vai gastar o que “desgastou” em Portugal. Será ele capaz de o fazer? Como nos primórdios da televisão neste país triste e desgraçado, se dizia “O programa segue dentro de momentos” e isso representava umas horas de ecrã negro como a noite mais negra, há que esperar pelos resultados do preparado mas desavergonhado Carlos Moedas. Até lá, benza-o a Senhora do Agrela, que não há santa como ela.
Antunes Ferreira, http://sorumbatico.blogspot.pt/ , 4 de Outubro de 2014


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