"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

quinta-feira, 10 de julho de 2014

de olhos abertos...

«Felicito-me por o mal me ter deixado a minha lucidez até ao fim; alegro-me por não ter que fazer a experiência da idade avançada, não estar destinado a conhecer esse endurecimento, essa rigidez, essa secura, essa atroz ausência de desejos. (...) Tudo está pronto: a águia encarregada de levar aos deuses a alma do imperador está de reserva para a cerimónia fúnebre. O meu mausoléu, no alto do qual se plantam neste momento os ciprestes destinados a formar em pleno céu uma pirâmide negra, ficará concluído pouco mais ou menos a tempo de se fazer para lá a trasladação das minhas cinzas ainda quentes. (...)
Almazinha, alma terna e flutuante, companheira do meu corpo, de que foste hóspede, vais descer àqueles lugares pálidos, duros e nus onde terás que renunciar aos jogos de outrora. Contemplemos juntos, um instante ainda, as praias familiares, os objectos que certamente nunca mais veremos... Procuremos entrar na morte de olhos abertos...»
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano


Adriano terá morrido na data correspondente a 10 de Julho de 138.


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