Ignorava que houvesse um Dia Mundial do Café, mas hoje há dias de tudo e o do café é merecido.
Na impossibilidade de oferecer um cafezinho a quem aqui vem, elogiem-se os espaços de sociabilidade que são os cafés, locais de troca de informações, de crítica, de tertúlia.
Almeida Garrett, frequentador do Marrare*, fez o narrador de Viagens na Minha Terra apear-se da "chouteira mula à porta do grande café do Cartaxo" e afirmar que «O café é uma das feições mais características de uma terra. O viajante experimentado e fino chega a qualquer parte, entra no café, observa-o, examina-o, estuda-o, e tem conhecido o país em que está, o seu governo, as suas leis, os seus costumes e a sua religião. Levem-me de olhos tapados onde quiserem, não me desvendem senão no café; e protesto-lhes que em menos de dez minutos lhes digo a terra em que estou se for país sublunar.»
Aquilino Ribeiro falava nos cafés como "a Universidade e antecâmara permanente da revolução" e José Gomes Ferreira, que escreveu os Poemas do Martinho, para recitar aos amigos da boémia e dos cafés, recorda, em A Memória das Palavras, «Os benditos cafés onde em moço gastei longas tardes ardentes a ruminar livros, a fazer versos, a escrevinhar no meu Diário, a redigir planos de romances, a aborrecer-me... (...) O que eu aprendi nessa Universidade verdadeira!»
* António Marrare, napolitano que terá chegado a Lisboa em finais do século XVIII, fundou quatro botequins: o de S. Carlos (junto ao teatro - 1801), o Marrare das Sete Portas, ao Arco da Bandeira (1804), o da esquina da Travessa dos Remolares (Cais do Sodré - 1809) e o de Polimento (no Chiado - 1819), o mais dândi e famoso dos cafés da Lisboa de então, que seria o frequentado por Almeida Garrett, que o refere por mais que uma vez nas Viagens. Chamavam-lhe de polimento porque era forrado com silhares de madeira polida (também há quem fale na gente polida que o frequentava). Ficava na Rua das Portas de Santa Catarina, hoje, curiosamente... Rua Garrett.
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