«(...) o que parece preocupante é o facto de cada vez menos haver em Portugal qualquer espécie de interesse por Camões e por aquilo que ele representa. O nome do autor de Os Lusíadas tende a ser apenas a marca distintiva de um feriado, ambíguo luxo nos tempos que correm, e pouco mais. As questões da identidade começam por estar relacionadas com a língua materna e esta deve a Camões a sua dimensão moderna. Mas estão à vista as consequências que, para a identidade, decorrem do actual estado de coisas: a língua materna está cada vez mais deteriorada (…). Nem sabemos pronunciá-la, nem sabemos escrevê-la ou falá-la com um mínimo de correcção. E nem vale a pena falar da situação catastrófica que virá a ser gerada pelo Acordo Ortográfico se este algum dia se aplicar (...). Vivemos numa época de apoucamento da língua, de empobrecimento do vocabulário, de aviltamento de todas as regras de gramática. (…) Vêmo-la subordinar-se servilmente ao facilitismo e à tecnologia, quando devia contribuir para uma estabilização dos seus paradigmas próprios, procurando equilíbrios permanentes com as tendências que são sinal dos tempos. (...) A língua de Camões está irreconhecível. Se ele voltasse ao mundo, decerto pensaria em rasgar a sua obra. Deixámos de ser dignos dela.»
Vasco Graça Moura, A língua de Camões (DN, 9 de Junho de 2010)
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