Onze pessoas morreram em Vancouver, na noite de Sábado, na sequência de atropelamento provocado por um condutor que "atirou" o carro contra uma multidão que participava num festival da comunidade filipina - o Lapu Lapu Day Block Party.
Diz o Diário de Notícias que o festival "presta homenagem a um líder da luta anticolonialista do século XVI nas Filipinas."
Esse líder, de nome Lapu Lapu ou Celapulapu, era um rajá que reinava na ilha de Mactan, uma ilhota do arquipélago das filipinas.
Na sua viagem de circum-navegação, Fernão de Magalhães, na sua procura pelas ilhas Molucas, foi dar às Filipinas (Março de 1521) e estabeleceu óptimas relações com Humabon, rei de Cebu, ilha fronteira a Mactan, que converteu em súbdito do imperador Carlos V. Numa cerimónia religiosa de pompa e circunstância, Humabon foi convertido ao cristianismo, adoptando o nome de Carlos.
Para demonstrar o valor de ser súbdito de Carlos V, Magalhães propôs-se realizar uma operação militar com cerca de 60 dos seus homens contra Celapulapu, submetendo este senhor rebelde que recusara prestar vassalagem ao rei de Cebu (e, indirectamente, a Carlos V).
Esta intervenção pecou por excesso de confiança face às centenas de nativos de Mactan que resistiram ao ataque. Depois...
«Os nativos entretanto foram-se aproveitando do cansaço dos invasores, os quais sofriam com o peso das armaduras muito quentes naquele clima tropical durante um combate prolongado em que os nativos atacavam incessantemente os poucos inimigos que ali estavam. Eles acabaram por se aproximar em grande número, tendo começado por ferir Magalhães com uma seta na perna direita que estava desprotegida. Depois ele recebeu outras feridas, nomeadamente no braço direito e na perna esquerda, o que o levou a cair e a receber tantos golpes dos numerosos assaltantes que acabaram por o matar, enquanto os companheiros fugiam com água pelos joelhos. Segundo um testemunho, o golpe final teria sido dado por uma lança na garganta.» (José Manuel Garcia)

«Foi desta forma absurda, no momento mais alto e soberbo de realização, que terminou a vida do maior navegador da História: numa miserável escaramuça com uma horda de insulanos nus. Um génio que, à semelhança de Próspero, dominou os elementos, venceu todas as tempestades, submeteu gentes e povos, é abatido por um ridículo insecto humano, Cilapulapu! (...)» (Stefan Zweig)
Estávamos em 27 de Abril de 1521. Celapulapu foi transformado em herói nacional filipino.
As Filipinas, arquipélago que foram alvo de um processo de colonização espanhol iniciado por Magalhães. O seu próprio nome deriva do de Filipe II de Espanha.
Lapulapu acabou por ser considerado, retroactivamente, o primeiro herói filipino e, em 27 de Abril de 2017, o Presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, declarou esta data como o Dia de Lapulapu, o primeiro filipino a opôr-se ao domínio estrangeiro.
Nunca ele teria pensado nisso!...
Os monumentos de Cebu e de Mactan exprimem uma dualidade entre a celebração da chegada dos espanhóis que colonizaram o arquipélago e deixaram uma forte herança católica e a celebração (do símbolo) de quem lutou contra os mesmos espanhóis e venceu o seu primeiro capitão, por acaso (na verdade, não tanto por acaso...), português.