"Quando todos os cálculos complicados se revelam falsos, quando os próprios filósofos não têm nada mais a dizer-nos, é desculpável que nos voltemos para a chilreada fortuita dos pássaros ou para o longínquo contrapeso dos astros ou para o sorriso das vacas."
Marguerite Yourcenar, Memórias de Adriano (revista e acrescentada por Carlos C., segundo Aníbal C. S.)

quarta-feira, 30 de abril de 2025

Dia Internacional do Jazz

O Dia Internacional do Jazz celebra-se no dia 30 de abril, desde 2012. A efeméride foi instituída pela UNESCO.
A data é celebrada com concertos e eventos por todo o mundo.


Charlie "Bird" Parker, Yardbird Suite

«Tudo o que em jazz se tocou desde 1945 até hoje, recorda Charlie Parker, verdadeiro criador do jazz moderno.» (José Duarte, 1964)


Campanha eleitoral em tempo de apagão

«Faço a luz e crio as trevas, sou o autor do bem-estar e o criador da desgraça.
Sou eu, o SENHOR, que faço tudo isto.»
(Isaías, 45:7)

 
E a campanha eleitoral sou eu que a faço!

O apagão foi um bom motivo para ter tempo de antena e procurar dar o ar de um chefe de Governo sereno e competente. 
Tudo funcionou bem por esse motivo: pela competência do Governo, nomeadamente do seu líder.
Toda a gente sabe que foi ele que solucionou o problema: ligou os fusíveis e atarraxou a lâmpada.

«Então Deus disse: "Que a luz exista!" E a luz começou a existir. (Génesis, 1:3)


Os cartoons do "apagão" (de André Carrilho)

 




Líder da luta anticolonialista... avant la lettre

Onze pessoas morreram em Vancouver, na noite de Sábado, na sequência de atropelamento provocado por um condutor que "atirou" o carro contra uma multidão que participava num festival da comunidade filipina - o Lapu Lapu Day Block Party.

Diz o Diário de Notícias que o festival "presta homenagem a um líder da luta anticolonialista do século XVI nas Filipinas."

Esse líder, de nome Lapu Lapu ou Celapulapu, era um rajá que reinava na ilha de Mactan, uma ilhota do arquipélago das filipinas.

Na sua viagem de circum-navegação, Fernão de Magalhães, na sua procura pelas ilhas Molucas, foi dar às Filipinas (Março de 1521) e estabeleceu óptimas relações com Humabon, rei de Cebu, ilha fronteira a Mactan, que converteu em súbdito do imperador Carlos V. Numa cerimónia religiosa de pompa e circunstância, Humabon foi convertido ao cristianismo, adoptando o nome de Carlos. 


Para demonstrar o valor de ser súbdito de Carlos V, Magalhães propôs-se realizar uma operação militar com cerca de 60 dos seus homens contra Celapulapu, submetendo este senhor rebelde que recusara prestar vassalagem ao rei de Cebu (e, indirectamente, a Carlos V).

Esta intervenção pecou por excesso de confiança face às centenas de nativos de Mactan que resistiram ao ataque. Depois...

«Os nativos entretanto foram-se aproveitando do cansaço dos invasores, os quais sofriam com o peso das armaduras muito quentes naquele clima tropical durante um combate prolongado em que os nativos atacavam incessantemente os poucos inimigos que ali estavam. Eles acabaram por se aproximar em grande número, tendo começado por ferir Magalhães com uma seta na perna direita que estava desprotegida. Depois ele recebeu outras feridas, nomeadamente no braço direito e na perna esquerda, o que o levou a cair e a receber tantos golpes dos numerosos assaltantes que acabaram por o matar, enquanto os companheiros fugiam com água pelos joelhos. Segundo um testemunho, o golpe final teria sido dado por uma lança na garganta.» (José Manuel Garcia)

«Foi desta forma absurda, no momento mais alto e soberbo de realização, que terminou a vida do maior navegador da História: numa miserável escaramuça com uma horda de insulanos nus. Um génio que, à semelhança de Próspero, dominou os elementos, venceu todas as tempestades, submeteu gentes e povos, é abatido por um ridículo insecto humano, Cilapulapu! (...)» (Stefan Zweig)

Estávamos em 27 de Abril de 1521. Celapulapu foi transformado em herói nacional filipino.

As Filipinas, arquipélago que foram alvo de um processo de colonização espanhol iniciado por Magalhães. O seu próprio nome deriva do de Filipe II de Espanha.

Lapulapu acabou por ser considerado, retroactivamente, o primeiro herói filipino e, em 27 de Abril de 2017, o Presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, declarou esta data como o Dia de Lapulapu, o primeiro filipino a opôr-se ao domínio estrangeiro.  

Nunca ele teria pensado nisso!...


Os monumentos de Cebu e de Mactan exprimem uma dualidade entre a celebração da chegada dos espanhóis que colonizaram o arquipélago e deixaram uma forte herança católica e a celebração (do símbolo) de quem lutou contra os mesmos espanhóis e venceu o seu primeiro capitão, por acaso (na verdade, não tanto por acaso...), português.


sexta-feira, 25 de abril de 2025

Há 50 anos: a primeira experiência de sufrágio livre, direto e universal





E que experiência!

Nesta data, ainda eu não tinha direito a votar.
Mas lembro-me do entusiasmo que foi, da campanha eleitoral, do movimento na rua no dia das eleições, da noitada a ouvir os resultados...
Era tudo uma novidade e uma descoberta. Uma aprendizagem.

E, à distância de 50 anos, penso no mérito de quem preparou todo o processo eleitoral - apesar da inexperiência de um acto desta natureza, pouco houve que alterar desde essas eleições - e na qualidade dos deputados eleitos para a Assembleia Constituinte, que ponderaram as experiências históricas dos diferentes regimes políticos contemporâneos portugueses e elaboraram uma Constituição que equilibra harmoniosamente, a meu ver, os diferentes poderes, procurando evitar erros cometidos no passado.


Sempre!









Há vantagem em ser jovem e poder andar às cavalitas!

Muita juventude no desfile, felizmente.
(e não falo dos pequenos que ainda andam às cavalitas)


segunda-feira, 21 de abril de 2025

A Páscoa do Papa Francisco

Francisco parece ter prolongado a vida para celebrar a Páscoa. Para então se entregar.

O aparecimento na varanda da Basílica de S. Pedro, ontem, para a tradicional benção, terá sido um momento de superação das suas fraquezas e de alegria para o Papa. 

Nunca senti empatia com qualquer dos seus antecessores.

Em Francisco via a preocupação genuína com as situações de injustiça e com quem as sofre.
Sentia a tolerância e a vontade de dialogar, mesmo com quem está distante.
Num mundo tão perigoso, a sua falta será sentida.


Obrigado!


domingo, 20 de abril de 2025

A Páscoa. Que Páscoa?

«(…)

Em todos os lugares, seja de que país for, a tarefa desta Páscoa não deveria ser só celebrar os ritos, mas alterar o rumo das sociedades, a situação das vítimas da guerra, da fome, da falta de uma ecologia integral.

A questão que se nos devia impor é esta: este mundo não poderá ser de outra maneira? A própria noção de criação é a de colocar o mundo sob a nossa responsabilidade.

Não se pode perder de vista que só nos salvamos através da salvação dos outros, através da convivialidade, através de tudo o que faz do ser humano o companheiro do outro, o irmão do outro, porque "a expressão máxima do diálogo com Deus é sempre estender a mão a quem precisa".

O Crucificado, o rejeitado por uma coligação de interesses, abriu, a todos, o caminho e o processo da ressurreição. Jesus, ao perdoar aos próprios inimigos, ao entregar nas mãos do Deus vivo aqueles que o entregavam à morte, consumou a sua insurreição contra tudo o que degrada e separa os seres humanos, isto é, o poder do ódio, o poder da morte. A partir daquele momento Jesus Cristo era, é e será para sempre uma vida dada.

Que a celebração da Ressurreição de Cristo nos ajude a procurar os bons caminhos para vencer as raízes dos ódios que ensanguentam a terra.

A todos uma Santa Páscoa!»

Frei Bento Domingues, Público



sábado, 19 de abril de 2025

Política de e/ou para voyeurs

Em dia das cerimónias fúnebres de João Cravinho, fundador do MES, ministro de mais do que de um governo, deputado na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, conselheiro de Estado, homem que discutia (as) políticas... dou comigo a pensar que, para as eleições legislativas que se aproximam, tão ou mais importantes que as ideias políticas parecem ser as contas das casas ou dos negócios dos dois principais líderes partidários. 

Não sei se as contas disponibilizadas por Pedro Nuno Santos, relativas à compra das suas duas casas, não terão tido mais "leitores" do que o programa do PS. Este período pascal forneceu um tempo extra para a bisbilhotice sobre o que devia ficar em privacidade ou ser só acedido por parte de quem tem funções (ou autorizações) legais para o fazer.

Aguardo se também serão apresentadas contas ou outros documentos por parte de Luís Montenegro.

Não sei se ficaremos esclarecidos e se as intenções de voto se farão mais em função do acerto dos números - e do que isso representa de confiabilidade nos líderes - ou das ideias apresentadas para a governação.

Quando comparo os tempos da História e os principais políticos activos com aqueles que nos foram deixando ou vão saindo da vida pública, fica um profundo sentimento de perda. 

João Cravinho (1936 - 2025)


Os comunistas de Wall Street




segunda-feira, 14 de abril de 2025

Mario Vargas Llosa (1936 - 2025)

E ontem se foi Mario Vargas Llosa, o Prémio Nobel da Literatura de 2010, que gostava de organizar a vida como se fosse viver eternamente e que pediu para ser lembrado pela escrita e pelo trabalho.


Um escritor que viveu intensamente a sua América Latina, presença constante na obra, e que diz ter começado a compreendê-la melhor quando a viu de fora.


domingo, 13 de abril de 2025

Carlos Matos Gomes (1946 - 2025)


Morreu Carlos Matos Gomes, um dos mais destacados elementos do Movimento dos Capitães na Guiné, berço do nascimento do espírito que levaria ao 25 de Abril.

Sempre muito interventivo na defesa dos valores por que se bateu mais de cinco décadas, "comando" nas três frentes de guerra (Angola, Moçambique e Guiné), foi um dos militares descartados com o 25 de Novembro.

Seguia-o nas suas análises políticas, argutas, por via de regra em contracorrente, mas, sempre, comprometidamente livres.

Comecei por o conhecer pelo nome de Carlos Vale Ferraz, pseudónimo com que assinou um conjunto de romances em que as questões em torno da guerra colonial são centrais.

Investigou e publicou sobre História Contemporânea de Portugal, nomeadamente Guerra Colonial, com Aniceto Afonso.

Vítima de doença oncológica, fez o deve e haver de uma vida em Geração D (editado em Março de 2024) .

«Esta geração protagonizou a grande mudança da história de Portugal, a que acabou com a ditadura, com a guerra, com as leis da sociedade patriarcal, mas continuou a conviver com a ideia de um glorioso passado em simultâneo com a ilusão de um futuro maravilhoso. É a geração de outros D: da Democracia, da Deserção, da Descolonização, das Doutrinas e do Doutrinar, da Discussão, da Dialéctica, do Desmistificar e do Desmitificar, do Desmobilizar, da Denúncia, da Desobediência, do Divórcio.

A Geração D viveu sob um regime de "doidos do império" e libertou-se dele! Calhou-lhe ser a primeira geração que, pela liberdade e universalidade do voto, foi inteiramente responsável pelo seu presente e pelo seu futuro.

Obedecer ou contestar? Falar ou calar-se? Recordar ou esquecer? Manter os ideais ou renegá-los? Vender-se no mercado ou manter-se fora da montra? Dilemas éticos e morais que têm provocado enjoos.

O D dos Dilemas é também o do Desafio e o do Desprezo pelos Desprezíveis da Geração D.»

Desiludido, mas não Desistente...


sexta-feira, 11 de abril de 2025

Impagável


Dei duas valentes gargalhadas: uma pela ideia da milenar aliança entre Itália (Roma) e EUA, outra pelas expressões faciais da tradutora.

A imagem foi partilhada por uma amiga no fb e tem data recente.
Pelo sim, pelo não, fui verificar. Não que duvidasse da capacidade de Trump dizer o que, de facto, disse...

O momento não tem a ver com o actual mandato - verificou-se no anterior mandato, em 16 de Outubro de 2019, durante uma conferência de imprensa, quando o Presidente de Itália, Sergio Mattarella visitou a Casa Branca.
A intérprete de Mattarella, Elisabetta Savigni Ullmann, parecia notavelmente confusa, enquanto Trump falava de assuntos externos dos EUA.

Sobre a Síria, Trump afirmou: “They’ve got a lot of sand over there. So there’s a lot of sand they can play with.”

Sobre os laços culturais entre EUA e Itália, declarou que... "Remontam a milhares de anos, à Roma Antiga." (“Date back thousands of years to Ancient Rome”). 

Priceless!


quarta-feira, 9 de abril de 2025

Apanhar bonés



Aind'a bunda

A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica.

Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora – murmura a bunda – esses garotos
ainda lhes falta muito estudar.

A bunda são duas luas gémeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.

A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.

Lá vai sorrindo a bunda. Vai feliz
na caricia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.

A bunda é a bunda,
redunda.
Carlos Drummond de Andrade


A propósito da dimensão do cérebro
de quem motivou estes poemas


Só a bunda existia, o resto era miragem


vestido de pinguim

Era bom alisar seu traseiro marmóreo

Era bom alisar seu traseiro marmóreo
e nele soletrar meu destino completo:
paixão, volúpia, dor, vida e morte beijando-se
Em alvos esponsais numa curva infinita.

Era amargo sentir em seu frio traseiro
a cor de outro final, a esférica renúncia
a toda a respiração de amá-la de outra forma.
Só a bunda existia, o resto era miragem.

Carlos Drummond de Andrade


domingo, 6 de abril de 2025

Indignação contra o betão

Manifestação, ontem, pelo resgate da Quinta dos Ingleses, contra o excesso de construção, pela protecção da orla costeira e dos parques urbanos e naturais no concelho de Cascais.



A mancha verde da Quinta ainda se vê ao longe, mas a verdade é que as obras da responsabilidade da Alves Barbosa avançam...

A mancha verde da Quinta dos Ingleses antes do seu futuro desaparecimento

Os hotéis da polémica (os mais centrais) na frente marítima de Carcavelos  


sábado, 5 de abril de 2025

Quem é que, afinal, percebe de comboios?


De antecessores a assessores, estas notícias deixam ver rabos de palha.                                             Eu não percebo de administração (nem de assessoria).                                                                                                                                      A administração não tem, à partida, gente especializada? Precisam de assessores?                  Os antecessores, actuais assessores, enquanto administradores, também tinham assessores?                                                                                    (só faltava que fossem os actuais administradores!)                                                                              São tantos os administradores como os assessores?                                                                              Por que razão mudaram os administradores?        Uns têm o cargo e outros o conhecimento?              Ganham mais os administradores ou os assessores (porque são gente especializada)?


Remover as nuvens


Foto de Annie Leibovitz
 

Joni Mitchell, Both sides now


sexta-feira, 4 de abril de 2025

III Congresso da Oposição Democrática - 4 a 8 de Abril de 1973


Entre 4 e 8 de Abril de 1973 decorreu em Aveiro, no antigo Cineteatro Avenida, o III Congresso da Oposição Democrática. Os dois congressos anteriores tiveram a designação de Congresso Republicano, mas na Oposição também havia lugar para monárquicos.


O ambiente era de desilusão perante o fracasso das reformas de Marcelo Caetano e a continuação da Guerra Colonial.

“Pela primeira vez se tentava a nível nacional a elaboração de um completo diagnóstico da sociedade portuguesa acompanhado de um verdadeiro programa de transformação nos mais variados sectores de governação, no âmbito de um processo amplamente participado.” (António Reis)

A declaração final estabelecia os objectivos a atingir, nomeadamente o fim da Guerra Colonial (houve a defesa do início das negociações com vista à concessão da independência a Angola, Moçambique e Guiné-Bissau), as liberdades democráticas e, declaradamente, “o objectivo final da conquista do socialismo”. O Partido Socialista seria fundado poucos dias depois (19 de Abril).

Na sua intervenção, José Medeiros Ferreira já previu, não sem alguma polémica, o envolvimento das Forças Armadas no derrube do regime, sendo também na sua comunicação ao Congresso que foram consagrados os célebres "Descolonizar", "Democratizar" e "Desenvolver", subtítulos da tese que apresentou e objectivos assumidos mais tarde no programa do MFA no pós-25 de Abril.

Consta que estiveram presentes vários Capitães que viriam a pertencer ao MFA.

As teses foram publicadas em sete volumes, dos quais quatro só foram publicados após o 25 de Abril de 74.


O Governo Civil de Aveiro proibiu qualquer acto público fora do espaço onde decorriam os trabalhos. Quando cerca de 500 congressistas decidiram fazer uma romagem cívica à sepultura do Dr. Mário Sacramento (1920 - 1969), médico e escritor oposicionista, ligado à organização dos primeiros congressos, houve uma violenta carga policial, tendo várias pessoas ficado feridas.




Documentário da RTP: Aveiro nos caminhos de Abril


"Os pinguins estão a roubar-nos há anos"