domingo, 23 de novembro de 2014

Isto de saber ler...

«A poderosa razão que o lavrador Roberto Rodrigues opunha para não mandar ensinar a ler o filho, era — que ele pai também não sabia ler, e mais arranjava lindamente a sua vida. Esta vinha a ser a razão capital, reforçada por outras subalternas e praticamente bastante persuasivas.
— Se o rapaz souber ler — argumentava triunfantemente o idiota — assim que chegar a idade, às duas por três, fazem-no jurado, regedor, camarista, juiz ordinário, juiz de paz, juiz eleito. São favas contadas. Depois, enquanto ele vai à audiência ou à Câmara, a Cabeçais, daqui uma légua, os criados e os jornaleiros ferram-se a dormir a sesta de cangalhas à sombra dos carvalhos, e o arado fica também a dormir no rego. E ademais, isto de saber ler é meio caminho andado para asno e vadio.
E citava exemplos, personalizando meia dúzia de brejeiros que sabiam ler e eram mais asnos e vadios que os analfabetos.»
Camilo Castelo Branco, Vulcões de Lama


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