terça-feira, 22 de outubro de 2013

Paulo da Gama

Não sei quais as fontes em que se baseiam certas afirmações sobre a boa índole de Paulo da Gama, o irmão de Vasco. Gostaria de as conhecer (será que preciso de reler com outros olhos - os olhos de quem procura Paulo - o diário da viagem, de Álvaro Velho?).


No (já) velhinho Dicionário da História de Portugal é afirmado que «De condição mais branda do que este [Vasco da Gama], tornou-se muito benquisto dos homens, intercedendo por eles nas iras do capitão e tratando com desvelo os doentes durante a epidemia de escorbuto no rio dos Bons Sinais.»
Seria o principal conselheiro do irmão, o seu apoio seguro. Quando os contactos com o Samorim de Calecute puseram Vasco da Gama em risco, Paulo recusou pôr-se a salvo com a armada sem o irmão.

Esta ideia passa para a ficção. Em Peregrinação de Barnabé das Índias, Mário Cláudio vinca os contrastes entre Paulo e Vasco - Paulo, aquele que Vasco mais respeita e cujos olhos busca na ânsia da segurança que não tem, «certificando-se sem descanso da permanência do mano, e a ele ligando a legitimidade de continuar (...)»

Na infância e juventude:
«E obrigavam-no os frades, roliços nos hábitos crivados de buraquinhos, a decorar o latim de Cícero, e era num ápice que lhe passava o mano Paulo as respostas certas sem que os outros se apercebessem.»

«"Paulo, vamos ver o que as vagas trouxeram", propõe ele ao irmão mais velho, imagem da segurança a que aspira, e correm ambos ao areal, e atravessam a extensão de sargaços onde pincham os pulgões. No outro vê o limite do território da liberdade, e a inventiva que lhe outorgam, escudando-se contra a solidão que acompanha o vazio das intenções, e vai pelo mano, a arrasta-o até à beira-mar. Comporta-se Paulo como a regra que é necessário manter, condescendendo com o ganapo, se bem que guardando a distância que lhe permite operar o súbito apelo ao mando. (...) Diante do patriarca muito magro, contido na preocupação de constantes obrigações para com o colectivo dos administradores e a pessoa de El-Rei, é paulo quem invariavelmente assume as culpas. Por amor ao catraio aguentou com o chicote e a bofetada, com três dias a açorda sem sal nem azeite, com a confiscação dos seus aprestos de pesca. Mas não desistiu de apoiar Vasco, porque nele identificava a surpresa a que conduz o ímpeto dos que fazem do curso das aventuras a condição maior da própria sobrevivência. Às perguntas do menino sobre a forma das estrelas e o giro em que andam, fascinado de mágicas, a fim de satisfazer um insaciável gosto de revelações, tomou Paulo uma carta dos Céus e da Terra, marcada por seres de toda a morfologia, mistos de homem e de animal, híbridos de múltipla descrição.»



Já na viagem, «(...) replicava Paulo com redobradas expansões da beatitude em que se apoiava, dela contaminando os marinheiros, carecidos de algum tempero para a agrura do semblante do que detinha a supremacia.»

«(...) o afável jugo de Paulo da Gama (...)»

«(...) Paulo da Gama, a quem venerávamos por chefe e amigo.»

E há mais... para quem quiser ler.

Igreja de N. Sr.ª da Guia -
Convento de S. Francisco (Angra do Heroísmo),
onde Paulo da Gama morreu e foi sepultado
Lápide evocativa
Com os terramotos frequentes nos Açores,
desconhece-se o paradeiro da sepultura de
Paulo da Gama

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