sábado, 10 de agosto de 2013

Gelo, gelados e/ou sorvetes

Alimento refrescante em dias quentes, os gelados ou sorvetes ("conceitos" difíceis de distinguir) já não são novidade. O uso do gelo ainda menos.
Os gregos bebiam água fresca com neve e água de neve derretida.
Os romanos usavam gelo nas bebidas. Nero (séc. I) terá servido o primeiro sorvete conhecido, feito com frutas esmagadas, mel e gelo.
Os chineses criaram uma forma de produção de sorvetes, a qual consistia na colocação de uma mistura de neve e de salitre à volta de recipientes com xarope, obtendo uma mistura sólida.

Terá sido da observação desta prática que Marco Pólo levou a informação para Itália. Assim se explicaria a especialização deste país na arte dos gelados.
Em França, os gelados passaram a integrar as ementas dos privilegiados após o casamento de Henrique II com Catarina de Médicis (1533). Iriam tornar-se mais populares a partir de finais do século XVII, sobretudo nos cafés, com a presença de mestres italianos.
Em Inglaterra, sabe-se que, desde meados do século XVII, se importava neve da Noruega e da América, a qual era armazenada para depois se consumir em festas.

Em Espanha, também por influência italiana, já era habitual, durante o Verão, a utilização de neve para refrescar bebidas por parte da aristocracia, na segunda metade do do século XVI.
Tomé Pinheiro da Veiga, na Fastigímia, obra escrita no reinado de Filipe III (de Espanha) e que aborda a vida na corte deste monarca, refere que "o maior regalo que tem Castela (...) é a neve no verão, que nunca falta, e só por ela se poderia ir daqui [Portugal] (...) e cá na terra [Valladolid - corte castelhana] não há maior deleite que água fria no verão e fruta com neve."
E foi via Filipes que a moda das bebidas refrescadas com gelo pegou em Portugal.

A neve já era consumida na água, por D. João III.
No início do século XVII há referências ao transporte de neve da Serra da Estrela para a corte "depois que as delícias de Itália entraram em Portugal com os costumes castelhanos". Em 1619, Filipe III fez uma visita a Portugal. Uma das exigências do rei foi que nunca lhe faltasse a neve durante a sua estada. E o neveiro Paulo Domingos celebrou o contrato de abastecimento de neve, garantindo o fornecimento diário de uma quantidade enorme de arrobas, entre 1 de Junho e 30 de Setembro, tantas que até ponho a hipótese de não ter interpretado bem o que li - 96 arrobas diárias??!! A partir de então, os monarcas procuraram ter sempre neve ao seu dispor.

E as referências posteriores começam a ser cada vez mais frequentes, pois vai-se difundindo o hábito de tomar neve – designação corrente de sorvete, gelado, carapinhada ou outros derivados de gelo.
Marina Tavares Dias afirma que era o “serviço de neve”, mais do que o de café, “a principal motivação para muitos clientes dos botequins setecentistas.”
Quanto a gelados, sabe-se que, em 1712, Eugénio da Cunha tinha uma loja de “sorvetes e mais bebidas” em Lisboa e também vendia gelo, havendo na época outras casas com o mesmo negócio.

O fornecimento de neve a Lisboa a partir da Serra da Estrela estava sujeito a muitos constrangimentos, a começar pela distância e pela dificuldade dos transportes. Muitos contratos de abastecimento não foram integralmente cumpridos.
Na década de 1740 foi construída a fábrica do Gelo da Serra de Montejunto, bem mais próxima de Lisboa, enorme vantagem no fornecimento de gelo à capital.
Essa fábrica, depois designada por Real Fábrica do Gelo, cessou a sua actividade em finais do século XIX, tendo sido classificada como Monumento Nacional em 1996, depois de trabalhos de limpeza e recuperação.

E era a esta fábrica que eu hoje queria chegar.


As principais fontes de informação que usei:

 



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